Moscou, capital da Rússia
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Presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda, se encontra com Natalya Sats no Teatro Musical Natalya Sats em Moscou (1981) |
As colinas Sparrow da Universidade de Moscou comandam uma vista estonteante da grandiosa cidade, capital da Rússia.
Esse panorama da cidade de Moscou é descrito em Guerra e Paz, obra-prima do renomado autor russo Liev Tolstói (1828–1910):
“Tudo é reluzente no ar puro e límpido, e então os olhos são hipnotizados enquanto o peito é envolto e revigorado com a fragrância do ar
de outono”.1
Conforme as palavras de Tolstói, o outono é a estação onde somos revigorados com a profunda “fragrância do ar”. Desejo sinceramente que vocês todos façam deste outono um período de autodesenvolvimento com o coraçõ e a mente abertos.
Tenho muitos amigos maravilhosos que cresceram em Moscou, dentre eles está o cosmonauta russo Aleksandr Serebrov
(1944–2013). Durante a sua infância, era fraco e vivia doente, então decidiu praticar esportes para se fortalecer física e mentalmente, e além disso estudou muito. Ele progrediu com seus desafios diários e participou de competições internacionais de matemática e física.
Serebrov acreditava que as qualidades que possuímos são como argila, e que o esforço, pouco a pouco, nos "molda ou ajuda a desenvolver essas qualidades.2
Desejo que vocês façam deste outono do esforço e da realização um período em que cada um se esforce ao máximo em seus respectivos desafios e tenha um tempo para trabalhar o próprio desenvolvimento.
Visitei Moscou pela primeira vez há quarenta anos, em setembro de 1974, quando a Rússia ainda era integrante da União Soviética.
Após a Segunda Guerra Mundial, o mundo foi dividido entre países do Bloco Ocidental, liderado pelos Estados Unidos com o sistema econômico chamado capitalista,e os países aliados da União Soviética, com o sistema econômico denominado socialista ou comunista. Esses dois lados se opunham ferozmente, e assim dois poderes econômicos e seus respectivos países deram início à Guerra Fria. Outro termo conhecido sobre esse assunto é “Cortina de Ferro”, a qual simbolizava a barreira existente entre os blocos.
No Japão, que era membro do Bloco Ocidental, a União Soviética era vista como uma inimiga. Poucas informações confiáveis sobre ela estavam disponíveis e a maioria da população japonesa a conhecia como um lugar cruel e aterrorizante.
Senti que essa situação era lamentável para ambos os países. Não era a União Soviética em si que era aterrorizante, mas a falta de conhecimento do povo japonês. Por essa razão, decidi visitar o país, conhecer com meus próprios olhos as pessoas que lá viviam e compartilhar com as outras o que vi.
Antes da minha viagem para a União Soviética, alguns me criticavam e perguntavam por que um líder de uma organização budista como eu deveria visitar um país que era rejeitado, até mesmo banido com uma religião. Além do mais, no mesmo período, existia uma tensão muito grande entre a China e a União Soviética. Mas não permiti me dissuadir e respondi sem hesitar: “Eu estou indo porque existem pessoas lá”.
Eu estava indo até a Rússia para encontrar meus companheiros, outros seres humanos que também desejavam a paz.
Durante essa viagem encontrei dois jovens recém-casados. Mais tarde, nas colinas Sparrow, notei vários outros casais assim como o que vi outrora, e aprendi que na Rússia existe uma tradição em que os recém‑casados devem visitar pontos turísticos famosos antes da cerimônia de casamento. Assim que os avistamos, algumas pessoas que me acompanhavam desde a Universidade Estatal de Moscou os chamaram de “Gorko! Gorko! Gorko!”. É a tradição de falar gorko, que significa "amargo". No primeiro brinde do casamento, os noivos devem se beijar para que façam o brinde se tornar doce.
Uma vez aprendida essa tradição calorosa e cheia de afeto, minha esposa e eu aplaudimos os recém-casados. Mais que tudo, quero direcionar esses momentos acolhedores e singelos para as pessoas no Japão.
Nosso elo humanístico é a base de tudo, com paz, cultura e educação para todas as pessoas; gostaria que vocês, meus jovens sucessores, carregassem o bastão do humanismo — esse é meu maior desejo.
A Rússia é o maior país do mundo, expandindo‑se pelo continente europeu. É 45 vezes maior que o Japão e cobre cerca de um oitavo de toda a área de terra do planeta.
Produziu arte e cultura magníficas que posteriormente se tornaram tesouros da humanidade. Durante o século 19 em particular, muitos compositores e escritores surgiram, como Tchaikovski, Pushkin, Tolstói e Dostoiévski. Desde a minha juventude gosto das obras brilhantes desses artistas, fui hipnotizado e fiquei tocado pelo amor incondicional e a confiança nas pessoas, a celebração da vida e da espiritualidade profundamente expressas nas obras-primas russas na literatura e na arte.
Visitei por seis vezes a União Soviética e a Rússia. Em muitas ocasiões, senti o acolhimento, o grandioso coração e a paciência do povo russo nutrido por sua
terra acolhedora.
O século 20 foi um tempo difícil para a Rússia. O povo passou pela Revolução Russa, duas guerras mundiais, assim como as expulsões feitas pela ditadura soviética, na qual muitas pessoas que se opunham ao governo foram mortas. E mesmo assim os russos não perderam a esperança no amanhã, avançando firmemente sempre à frente.
Quando Tolstói tinha a idade de vocês, escreveu em seu diário: “Paciência e dedicação, e com certeza atingirei tudo o
que desejo”.3
Não há treino melhor do que a paciência. Perseverança é a chave para a vitória.
Não importando quão difícil as coisas estejam agora, tenha certeza de que o inverno sempre se torna primavera, e essa fase difícil não permanecerá para sempre. Sabendo disso, não se deixe derrotar por nada. Aqueles que continuam lutando são vitoriosos no final.
Nichiren Daishonin escreveu: “O Buda é conhecido também como "Aquele que Suporta” (WND, v.I, p. 41).
Vocês são os futuros líderes que irão solidificar o caminho rumo ao mundo mais humanístico que todos percorrerão, porque cada um de vocês, meus amigos da Divisão dos Estudantes Esperança e Herdeiro, possui uma incrível e preciosa missão. Vocês estão prestes a encarar muitos desafios e atribulações.
Por isso, eu gostaria que vocês se lembrassem da importância da paciência e da perseverança.
Há quarenta e dois anos, não havia nenhum membro da SGI na Rússia. Hoje, os bodisatvas da terra estão emergindo alegremente em Moscou e em outras cidades, fazendo contribuições positivas para a sociedade. A Universidade Estatal de Moscou e a Universidade Soka do Japão possuem alunos que podem realizar um intercâmbio entre elas todo ano.
Minha esposa e eu tivemos uma amizade muito próxima com Natalya Sats (1903–1993), fundadora e diretora do primeiro teatro de ópera para crianças. Em nosso primeiro encontro, em maio de 1981, ela nos recebeu com um sorriso no Teatro Musical Infantil de Moscou — atual Teatro Musical Natalya Sats — não muito distante das colinas Sparrow.
Revelando suas emoções com gestos expressivos, ela tinha a espontaneidade de um genuíno espírito livre. Com ela entre minha esposa e eu, seguimos juntos de mãos dadas, enquanto ela nos guiava pelo maravilhoso teatro e nos apresentava para seus jovens alunos, dos quais estava muito orgulhosa.
A Sra. Sats perdeu o pai quando estava com 9 anos. Mais tarde, seu marido foi exilado pela ditadura e ela foi forçada a viver na prisão como "a esposa de um inimigo do povo”. Com tal experiência, seu cabelo castanho ficou cinza, rapidamente, de uma só vez.
A mãe dela, que era seu maior apoio espiritual, morreu devido a lesões sofridas em um ataque aéreo, mas não antes de levar o traje de teatro da filha do local do bombardeio para a casa de um amigo.
Depois que a Sra. Sats foi libertada da prisão, ela visitou a residência do amigo onde sua mãe tinha morrido. Deitou-se naquela noite para dormir no sofá onde sua mãe tinha estado pela última vez. Ela teve um sonho em que a mãe lhe dissera, chamando-a pelo apelido: “Cante, Natasha, o que quer que aconteça, continue cantando. A vida deve ser apreciada”.4 A Sra. Sats foi capaz de se recuperar do seu desespero. Recusou-se a ser derrotada pela mais dura adversidade ou tragédias que lhe ocorreram. E continuou avançando, dedicando a vida à produção de performances artísticas para crianças.
Ela disse: “Nada foi fácil para mim. Sempre enfrentei desafios e gosto de superá-los”.5
A Sra. Sats possuía um trunfo na manga que a ajudava a superar as adversidades. Quando se sentia muito triste e sem esperança, ela se imaginava em uma nova versão no palco. Assim, como se ela fosse a própria diretora da sua vida, piscava para ela mesma no palco e dizia: “Você parece ter se metido numa situação complicada. OK, Natasha, estou esperando ansiosamente para saber como irá escapar desta!”.6
A vida e a juventude são cheias de emoções. Possuem acontecimentos felizes e inesperados. Também possuem alguns momentos de sufoco e outros, de reviravolta, de alívio e de descanso. Essa variedade os torna tão interessantes.
Os momentos em que as coisas parecem difíceis ou dolorosas são a sua chance de se desenvolver de forma fascinante na fase da juventude, de maneira triunfal, com a resolução de que tudo começa agora e que chegou o momento de se desafiar.
Louvando os esforços valiosos de seus discípulos que se recusaram a ser derrotados pelas adversidades, Daishonin enaltece: “Existirá alguma história tão maravilhosa quanto a sua?” (WND, v. I, p. 499).
Seus esforços enquanto jovens que abraçam o supremo ensinamento da Lei Mística se tornarão histórias que todas as pessoas do mundo irão dizer com admiração: “Observem como eles viveram e não se permitiram ser derrotados por nada!”.
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Presidente Ikeda e Mikhail Gorbachev estreitaram profundos laços de amizade por meio do diálogo |
Em 27 de julho de 1990, conheci o presidente Mikhail Gorbachev, cujo papel foi crucial em acabar com a Guerra Fria.
Uma possível visita ao Japão realizada por um líder soviético era vista com extrema cautela naquela época. A primeira coisa que disse em nosso encontro no Kremlin, em Moscou, foi: “Eu tive de vir e dialogar com você. Vamos
fazer com que faíscas voem e conversar
aberta e honestamente sobre tudo, para o bem da humanidade e para o bem da relação
Japão-União Soviética!”.
O presidente Gorbachev sorriu imediatamente e durante nosso diálogo significativo ele expressou seu sincero desejo de conhecer o Japão no ano seguinte, quando as cerejeiras estivessem floridas. Suas palavras viraram notícia de primeira página no mundo todo.
Conforme prometido, em abril de 1991, Gorbachev visitou o Japão, tornando-se o primeiro líder soviético a dar esse primeiro passo, sinalizando a nova era de uma primavera histórica de amizade para ambos os países.
Lembro-me de um momento encantador quando o encontrei em outra ocasião — novembro de 1997 — na Escola Soka de Ensino Fundamental e Médio de Kansai, junto com sua esposa, Raíssa. Os estudantes da Escola Soka de Kansai guardam as palavras da Sra. Gorbachev, que lutou ao lado do marido durante um árduo caminho: “Nós sofremos vários golpes diferentes durante nossa vida, e alguns deles não se curaram. Não podemos realizar todos os nossos sonhos. Porém, sempre existe algo que podemos alcançar. Nós sempre teremos um sonho a se realizar. Aqueles que conseguem se levantar e continuar toda vez que tropeçarem sempre serão vitoriosos no final”.7
Você sempre poderá alcançar a vitória em sua vida diária se, não importando o que acontecer durante o caminho, deixar como legado algo que lhe dê orgulho. Verdadeiros vitoriosos são aqueles que nunca desistem, que continuam pensando positivo e de forma alegre, que acreditam sinceramente em sua missão, e lutam incansavelmente até o final. Sua vida incrível, meus caros amigos, inspirará e encorajará incontáveis pessoas ao redor do mundo. O descortinar das suas histórias está acontecendo.
Seus pais, sua família, a família Soka, eu e todos os jovens do futuro do mundo inteiro estarão observando e aplaudindo sua revolução diária, meus amigos, atores brilhantes do palco da vida!
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